domingo, 3 de fevereiro de 2013

Coluna 152 - publicada no jornal Correio Agudense - edição de 30JAN2013

A morte beijou o coração do Rio Grande

Havia que encontrar uma frase que coubesse no contexto da Tragédia em Santa Maria do dia 27 de janeiro que fosse sensata, razoável, que não ferisse sensibilidade, não fosse mórbida e que ainda carregasse alguma originalidade depois de tanto que já se leu e ouviu, passadas 48 horas do acidente. Traduzi o nome da boate para o português e combinei essa tradução com o patronímico de Santa Maria. O resultado – A MORTE BEIJOU O CORAÇÃO DO RIO GRANDE.
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O mundo vive uma verdadeira catarse. A consternação e a solidariedade estão explícitas no sofrimento e pesar externadas nas lágrimas vertidas e nas preces balbuciadas em credos e línguas tantos.
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É impossível não se emocionar. Não temos antídoto para a comoção. O sentimento nos confronta com a angustia das famílias que pranteiam seus rebentos. A genial escritora gaúcha Marta Medeiros sintetiza bem o que sentimos, quando escreve “Quem não tem filho sofre. Quem tem se arrebenta!” É exatamente isso. Se você tem filhos adolescentes ou pós-adolescentes que poderiam estar lá sabe do que estou falando. Se não tem, não sabe. Nós olhamos nossos filhos como uma extensão nossa. Eles são nossa síntese. Queremos que vivam em plenitude. Torcemos que se encontrem consigo mesmos na realização de seus projetos e no uso dos talentos de que foram dotados no ensaio geral da existência. Nos alegramos quando se divertem. Com vigília nos fazemos amigos de seus amigos para sabê-los melhor. Em síntese eles são nós e nós estamos neles na simbiose divina da criação. Perdê-los não nos passa pela mente. Ainda mais se nos tímpanos ainda ressoa quando pais tão próximos choraram a perda de filhos seus, irmãos nossos, como em 1981, quando o jovem Humberto, irmão da Rosa, foi arrebatado com só quinze anos, e quando em 2000, meus pais perderam o Marcelo, meu irmão camarada. Jovens aqueles, jovens os da boate Kiss. Essa correlação sensibiliza e eu olho para minha filha louvando estar viva. Você faz o mesmo, não?!
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A estupidez da vaidade exibicionista cega os olhos e inibe o bom senso. Como pode a Gurizada Fandangueira lançar mão de artifício incandescente em um meio tão vulnerável? Será que os produtores e integrantes dessa banda musical não mediram o risco do emprego de tais efeitos pirotécnicos para si próprios e para os demais?
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A prisão, ainda que temporária, de músicos, aplaudida sem dúvida é, no entanto, como tranca de ferro em porta arrombada. Quantas vezes fizeram a mesma coisa e foram entusiasticamente aplaudidos? Quanta grana ganharam, valorizados por sua apresentação incluir show de efeitos como o apresentado no palco da boate Kiss? Ninguém viu? Opa, muitos viram e pagaram para correr o risco de acontecer o que no sábado de fato se sucedeu. A festa tinha o sugestivo nome de “Aglomerados”. Ao final se conclui que foram “embretados” ... duzentos e trinta e um para a morte. O que até sábado era apogeu de um ato, agora é um ato execrado.
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E os donos da Kiss? Dois deles terão, ao menos por alguns dias, um alçapão diferente do que montaram, para refletir sobre os efeitos de sua faina pelo lucro à qualquer preço.
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Para todos nós, e principalmente para quem tem a incumbência ou a atividade de administrar espaços partilhados, a Tragédia de Santa Maria causa uma engolida em seco, não raro seguida de soluço bem duradouro.
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Ouvi, Li ou Vi –
Li: Confio a Deus Pai Misericordioso os falecidos e peço ao céu conforto e melhoras para os feridos". Secretário de Estado do Vaticano, Cardeal Tarcisio Bertone, apresentando mensagem do Papa Bento XVI às famílias e à comunidade enlutada.
Fui a Santa Maria e a dor que presenciei é indescritível. Falo dessa dor para lembrar a responsabilidade que temos, como poder Executivo, com a nossa população. Temos o compromisso de assegurar que ela (a dor) jamais se repetirá.” Presidenta Dilma Roussef, falando aos Prefeitos na abertura da XVI Marcha, promovida pela CNM
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Paz e Bem.

Coluna 151 - publicada no jornal Correio Agudense - edição de 23JAN2013

A ideia de trabalho como castigo precisa ser substituída pelo conceito de realizar uma obra

NOVAMENTE NA ROTA – Cumprido o período sabático de duas semanas em que o CA não circulou, retomo minha parte na cúmplice relação semanal de escrever, torcendo que os leitores estejam dispostos a assumir sua parcela lendo as inquietações e as observações que me inspira e desperta a vida e suas nuanças. Encontrei uma fonte muito pertinente a este momento de novamente olhar o horizonte, agora sob o signo de um ano cabalístico para tantos (o ano treze do segundo milênio) – o Filósofo Mário Sérgio Cortella. De suas proposições já me vali em tempos passados quando refleti sobre a incompletude de quem se situa no meio, pois “Deus engolirá os mornos”, lembram?!
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Desejando escrever sobre a atitude de fazer as coisas bem feitas, sou levado a retroceder no tempo para encontrar a raiz da palavra trabalho. Menciona Cortella no livro “Qual é a tua Obra?” (Vozes, 2012) ser trabalho palavra derivada do latim vulgar Tripalium, significando um instrumento de tortura, composto por três paus intercruzados, aposto ao pescoço do condenado. Na evolução do mundo ocidental, com forte impacto do domínio grego-romano nos séculos II a.C até V d.C., trabalhar era sinônimo de sofrimento, imoral, indecente, uma verdadeira  punição. Trabalhava quem era escravo. Esta concepção ainda perdura. Resquícios desta visão são percebidos quando se ouve (ou se diz) “Quando eu parar de trabalhar, vou fazer isto ou aquilo!” Será, então, preciso esperar passar o martírio do trabalho para ser feliz – é o que parece.
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Mas ninguém para completamente de trabalhar. Pode-se sim, depois de certo período, deixar de ter uma dependência do trabalho, por ter-se conseguido cumprir certo tempo de jornada formal de atividade. Mas ninguém deixa de fazer algo. E nesse fazer a pessoa se coloca inteira, seja para continuar existindo (o trabalho como fonte de renda e sustento), seja para ganhar reconhecimento (o trabalho como fator de entrega pessoal em favor de outro ou da comunidade). Esta segunda alusão ao que fazemos remete à expressão ‘labor’, também do latim. Os gregos chamavam de poiesis, com o significado de ‘aquilo que faço, que construo – a minha criação, na qual crio a mim mesmo, ao tempo em que crio o meu mundo.
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A ideia de trabalho como castigo precisa ser substituída pelo conceito de realizar uma obra. Não mais Tripalium, mas Poiesis. O jardim aparado, o documento lavrado, a lavoura plantada, a casa construída, a tese defendida, a sentença proferida – tudo deve representar a obra de seu autor, nunca uma estafante tarefa cumprida sob grilhões do Tripalium.
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Se o que fazemos tem um sentido, se nossa ação ajuda a criar o mundo em nosso redor, então estamos falando de nossa obra, não de nosso trabalho. Todos os dias, todas as horas devem ser dedicadas ao labor das obras que fazemos e não ao trabalho como um castigo.
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Pretendia emendar ainda um posicionamento sobre os reflexos para a sociedade (e para o protagonista) de uma obra bem feita e obra mal feita. Mas não há mais espaço.
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Ouvi, Li ou Vi –
Li: O carro é o cigarro do futuro. Vai continuar existindo, mas com restrições. Será usado só par o lazer. Será pequeno, elétrico, e você não será o único dono.” Jaime Lerner, legendário ex-governador do Paraná e ex-prefeito de Curitiba, analisando a realidade dos espaços urbanos (Revista Amanhã, Dez2012)
Li: Ser Prefeito é bom, é muito bom. Mas prefeitos que só enxergam problemas ficarão em situação difícil. Se ele se concentrar nos problemas, vai perder a chance de fazer as grandes mudanças.” (idem)
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Paz e Bem.

Coluna 150 - publicada no jornal Correio Agudense - Edição de 3JAN2013

Valério, você afirmou: “Podem Confiar!” Você mesmo disse: “Governarei para todos e com todos!” Assim desejamos.


Carta para Valério – Inicia-se o governo Valério Trebien. A partir de agora é prá valer. Terminou o confortável e até romântico tempo de espera; tempo em que era bastante esboçar um propósito: “farei assim, deverá ser assim, pretendo que aconteça isto e aquilo...” Agora está chegado o tempo, o brete foi aberto, a campana soou. Os aliados e a oposição cravam o olho. Os movimentos, as atitudes, as palavras, as ações e as omissões passam a ter consequências, pois que saídas do mandatário.
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O que quero, como agudense, do governo Valério? (havia escrito o que querem os agudenses, mas corrigi, pois não sei se todos querem a mesma coisa).
Que seu governo seja decente – Faça com que o governo espelhe e inspire retidão e coerência. Que seu sim seja sim e seu não seja não. Chafurda a imagem do “Meu torrão, meu torrão mais amigo” se houver descompasso entre aquilo que dizemos e proclamamos de nossa terra daquilo que de fato somos e praticamos.
Que seu governo seja amável – O munícipe e quem mais acessar o governo, seja contribuinte ou pedinte, com ou sem razão na proposta, deve notar que está sendo atendido com afeto, com atenção e carinho. Que todos os servidores – os eleitos (na essência os únicos escolhidos pelo povo) tanto quanto os que fazem girar a engrenagem nos cargos efetivos ou designados, respeitem a pessoa, suas circunstâncias e sua individualidade, não no estrito limite comportamental, mas que seja efetivo na diligente, correta e pronta prestação do serviço esperado e possível. No relacionar-se e no cumprir com sua tarefa, que ali haja amabilidade. Afinal, em um regime de liberdade, ninguém é obrigado a estar onde está. Mas se aceita ali estar, deve ali fazer o seu melhor.
Que seu governo conjugue o verbo dialogar – O povo tem muito a dizer e muito quer ouvir. Sem que a autoridade e a responsabilidade final sejam subtraídas, ouvir e falar faz muito bem. O mais excelente meio de ressonância da população é o Legislativo. Os legisladores eleitos (com maior ou menor mérito, isto não importa mais) são os legítimos representantes da população e o que disserem com responsabilidade e seriedade, deve ser levado em conta. O governo pode e deve contar também com os muitos organismos coletivos, chamados Conselhos Municipais. As Audiências Públicas são igualmente formidáveis oportunidades de conversação. Mandadas instalar por ditado de lei ou por iniciativa própria do governante, esta reunião se presta para informar e colher informações. O governo deve aprender a gostar de fazer e a acatar o que for decidido nestas ainda hoje raras reuniões. E, por favor, os ouvidos devem estar abertos a todos. Muito cuidado com o canto da sereia da bajulação. Esta abordagem é perniciosa, pois pode inibir os sentidos de sentir a realidade.
Que o “eu” dê lugar ao “nós” – Repetindo o que já escrevi antes “sem que a autoridade e a responsabilidade final sejam subtraídas”, ser inclusivo será sempre melhor. O “nós” no lugar do “eu” corresponsabiliza, motiva, integra, inclui.
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Valério, você afirmou: “Podem Confiar!” Você mesmo disse: “Governarei para todos e com todos!” Assim desejamos. Torcemos por seu sucesso na jornada.

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Na medida certa devem ser dosadas a razão e a paixão. Para aqueles que neste janeiro assumem tarefas de governo refletir, transcrevo um extrato do que disse o Profeta, quando perguntado sobre a Razão e a Paixão: “Vossa razão e vossa paixão são o leme e as velas da vossa alma navegadora. Se as vossas velas ou o vosso leme estiverem quebrados, podereis apenas ser sacudidos e sem rumo, ou até mesmo ficar presos em uma calmaria no mar interior. Pois a razão, governando sozinha, é uma força que confina; e a paixão, sem cuidado, é uma chama que queima até se destruir. Portanto, deixai que vossa alma exalte vossa razão até a altura da paixão, para que ela possa cantar; e que vossa paixão seja dirigida pela razão, para que vossa paixão possa viver a sua própria ressurreição diária, e como a fênix, ressurja de suas próprias cinzas.” 
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Ouvi, Li ou Vi –
Ouvi, nas palavras ditas em suas últimas declarações, que AriAA cogita em buscar um sexto mandato como Prefeito. Quando? Com a força política que tem, quando quiser.
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Paz e Bem.